terça-feira, 1 de dezembro de 2020

"Gaudete et Exultate" (IV) | As bem aventuranças: caminho de santidade


Jesus explicou, com toda a simplicidade, o que é ser santo; fê-lo quando nos deixou as bem-aventuranças. Estas são como que o bilhete de identidade do cristão. Assim, se um de nós se questionar sobre «como fazer para chegar a ser um bom cristão», a resposta é simples: é necessário fazer – cada qual a seu modo – aquilo que Jesus disse no sermão das bem-aventuranças. Nelas está delineado o rosto do Mestre, que somos chamados a deixar transparecer no dia-a-dia da nossa vida. 

Viver as bem aventuranças é andar conta corrente. Hoje a realidade quer anestesiar-nos. Possamos nos desprender, desinstalando-nos, abrindo-nos a Deus! Permitindo sermos amados por Deus e amarmos os irmãos.

Felizes os pobres em espírito porque deles é o reino dos céus. Onde colocamos a riqueza de nossa vida? Aos pobres de espírito Deus pode preencher com a Sua santíssima novidade. O pobre interior é o pobre em espírito. Quanto menos eu tenho mais posso pensar no outro.

Qual é a minha postura diante do uso das coisas? Partilho com generosidade? Apego-me às coisas ou apoio-me em Deus que me providencia todas as coisas? Devo ter o coração livre para amar a Deus sobre todas as coisas.

Felizes os mansos porque possuirão a terra. Jesus disse “Vinde a mim porque sou manso e humilde de coração”. Devo suportar os defeitos dos outros e não me escandalizar com as suas fraquezas. É preciso desarmar o espírito. A agressividade é fruto da insegurança. Jesus era seguro de si próprio, não tinha medo de nada. Jesus não excluía ninguém. Quanto maior a ferida maior compaixão de Jesus. Se a gente se desarma, o outro vai se desarmar também. Assim acontece a abertura ao diálogo, à conversa. Ser manso não é ser bobo.

O manso favorece a harmonia no ambiente

O Reino dos céus é a dos que violentam seu interior para que a vontade de Deus prevaleça. Quanto mais desprendido eu sou mais tenho para partilhar. A vida deve falar. Mansidão é fruto do Espirito Santo. Entre os cristãos a mansidão ‘está muito embaixo’ devido a questões afetivas, à falta de maturidade. É próprio da criança receber e é próprio do adulto dar. A capacidade do outro não anula a minha capacidade. Somos um corpo. Todos são beneficiados pelo bem de cada um. Não me devo sentir agredido, mas edificado pelo bem do outro.

Os mansos verão as promessas de Deus realizarem-se em suas vidas. Mansidão e pobreza interior são sinônimos. O manso é uma pessoa de fé que confia em Deus. Devo pedir a Deus a graça de silenciar. Se for preciso, chore e desabafe diante do Senhor. Atitude nobre é tomar a iniciativa no pedir perdão. Isto faz o outro se desarmar e aí entramos em acordo. É Deus que vai tudo realizar. Assim deixo-me conduzir por Deus. A mansidão nos dá força de estamos andando no caminho certo.

Não perder a paz e reagir com humildade e mansidão, isto é santidade.

Felizes os que choram porque serão consolados: o mundo quer esconder situações dolorosas, mas chorar faz parte da vida. Um grande esforço da ciência é amenizar o sofrimento, tudo bem, mas também devo aceitar o sofrimento como parte da vida. Devo deixar-me traspassar pelas aflições dos outros, mergulhar na profundidade da vida e fazer-me solidário. Ter capacidade de compadecer-me. “Tende em vós os mesmos sentimentos de Jesus”. Muitas vezes se chora porque não temos mais nada o que fazer . Chorar é render-se, é deixar Deus agir em nós. Saber chorar com os outros e pelos outros: isto é santidade.

Felizes os que têm fome e sede de justiça porque serão saciados. A justiça divina é diferente da justiça humana. A justiça segundo a Escritura é diferente da que os homens defendem. Na justiça humana cada um recebe o que merece. Na justiça de Deus cada um recebe aquilo que precisa. O maior pecador é o que mais precisa da misericórdia de Deus. Quem tem fome e sede de justiça é chamado em primeiro lugar pra ser justo. Na Bíblia o justo é quem teme a Deus e segue a Sua vontade, que busca em tudo agradar a Deus. Os mais necessitados devem ter suas necessidades supridas. Não devo me conformar com a injustiça mais regozijar-me com a verdade. Não posso ser conivente com mal. Devo me esforçar para ser instrumento da justiça de Deus para os pequeninos.

Buscar a justiça com fome sede: isto é santidade

Felizes os misericordiosos porque alcançarão misericórdia. Perdoar e compreender é preciso. “Tudo o que desejais que os outros vos façam fazei-o vós a eles”. Misericórdia é compadecer-se, ir ao encontro do outro e perdoar. São duas as dimensões da misericórdia. Devemos nos colocar no lugar do outro e reproduzir na vida o reflexo da perfeição de Deus sendo ‘misericordiosos como o vosso Pai Celeste é misericordioso’. Devemos voltar o coração para a miséria do outro e nos compadecer, sofrendo com o outro, colocando-nos no lugar do outro.

É questão de perceber e considerar que o outro errou por fraqueza, por que é humano. Devo considerar a intenção do outro assim sofreremos menos.

Que a minha caridade seja estímulo, incentivo para o outro. Que eu não aponte ou condene. Devo fazer-me próximo com um olhar, um sorriso que ajuda. Devo desconfiar de mim mesmo. Devo superar o orgulho ferido e ir além, buscando a graça de enxergar mais longe e desabafar com o Senhor. Chorar e retomar a direção.

Olhar e agir com misericórdia: isto é santidade

Felizes os puros de coração porque eles verão a Deus. Buscar ter um coração simples e bom, com verdadeiras intenções para além do que aparentamos. Deus quer nos dar um coração novo. Ele vê o interior e sabe quando não sou sincero. Do coração humano brotam as maldades. Devo desconfiar de mim mesmo. A vida cristã é vida interior de relação com Deus que transforma o coração. Este é o nosso anseio, a nossa busca: purifica-me Senhor, para que eu me torne mais semelhante a vós! Este é o grande trabalho do discípulo de Jesus. Os puros de coração enxergam Deus na vida. Têm maior sensibilidade à Sua voz e aos Seus sinais

‘Eu te louvo pai porque revelastes estas coisas aos pequeninos’. Que o nosso olhar seja purificado para olharmos Deus. Silenciarmos, rezarmos e discernirmos para que a verdade venha à tona. Se verbalizo decisões precipitadas posso fazer estragos. Devo silenciar, rezar, e fazer atos de amor. Expressar aquilo que vai no coração, no mais profundo. Quando a intenção é reta, a verdade vem à tona. Quando o coração ama Deus e ao próximo ele é puro e assim pode ver a Deus Manter o coração limpo do que mancha o amor: isso é santidade.

Bem aventurados os pacificadores pois serão chamados filhos de Deus. A murmuração não constrói. Quem murmura não é bem aventurado. Preciso rezar e pensar antes de falar. O silêncio vale mais do que as palavras. Devo ser moroso para falar e moroso para me encolerizar. Senhor, dá-me a graça de não falar em determinadas situações. Assim errarei menos. Os pacíficos são fontes de paz. A unidade é superior ao conflito.

Sentido bíblico da paz: em hebraico significa SHALOM: plenitude de vida. Plenitude interior do encontro com o Senhor da consolação. É a vida de Deus em mim. Isso me faz senhor de mim mesmo. Livre para amar.

Devo ser pacífico, mantendo essa graça em minha vida. Manter a união com Deus. Ser transmissor, mediador da paz, apaziguar e reconciliar . A decisão a tomar será a vontade de Deus se me der paz.

Onde há abertura à Palavra de Deus, há paz. A paz não é mero esforço humano. Posso apaziguar, pacificar mais a paz não é esforço meu, é fruto do Espírito Santo. Cuidado com a falsa paz egoísta. Não posso excluir ninguém devo ter grande abertura de mente e de coração. Deus coloca pessoas difíceis em nossas vidas para aprendermos com a situação e ajudarmos estas pessoas. Devo aprender a conviver. Não posso me cansar do outro pois Deus não se cansa de nós. Devo transmitir paz às pessoas difíceis. A paz exige grandeza de alma. Semear a paz ao redor: isso é santidade.

Bem aventurados os que sofrem perseguição por causa da justiça porque deles é o reino dos céus. A perseguição é inerente à vida cristã. A cruz é fonte de amadurecimento e santificação. Os apóstolos eram cativantes e quanto mais atraíam pessoas para Cristo, mais suscitavam inveja dos seus inimigos. Isso causava perseguição, torturas e morte . As calúnias e falsidades também são perseguições.; as zombarias nos fazem passar por pessoas ridículas. Existe o martírio cruento mas também o martírio ideológico, devido à sociedade secularizada que quer tirar Deus dos ambientes. Há ambientes hostis ao Evangelho. Nestes lugares sofre-se o martírio ideológico. A vida consagrada é chamada a ser um martírio lento . Quando terminou a perseguição dos primeiros séculos os primeiros consagrados foram para o deserto oferecer a Deus às dificuldades sacrifícios diários, sendo obedientes e buscando a vontade de Deus em todas as circunstâncias. Oferecer as cruzes do dia pela santificação de alguém é sacrifício agradável a Deus. Devo oferecer a Deus as contrariedades e transformar tudo em sacrifício.

Abraçar diariamente o caminho do evangelho mesmo acarretando problemas: isto é santidade.

Continua...

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